quinta-feira, 10 de julho de 2014

OPINIÃO - ANO XX - Nº 220 - JULHO 2014

O aniversário de uma imprensa não tão espírita

“O Écho d’Alêm-Tumulo”-145 anos
Há 145 anos, em julho de 1869, saía a edição número um do periódico que passou à História como o primeiro jornal espírita do Brasil. “O Eco”, entretanto, tinha como expresso propósito resgatar o cristianismo primitivo dentro da estrutura da Igreja Católica. Era essa leitura que Olympio Telles de Menezes e outros intelectuais brasileiros da época faziam do espiritismo.

Um espiritismo de “dóceis católicos”
A história da imprensa espírita e do próprio espiritismo no Brasil está intimamente ligada à vida do intelectual baiano Luis Olympio Telles de Menezes, jornalista, professor de latim e francês, em Salvador, autor do opúsculo “Filosofia Espiritualista” (1866) e fundador do primeiro centro espírita brasileiro, o Grupo Familiar de Espiritismo (1865). Católico fervoroso, Telles de Menezes, impressionou-se com a leitura das obras de Allan Kardec. Lendo-as no original francês, vislumbrou nelas o futuro do próprio catolicismo, então religião oficial do Império.
A Igreja, entretanto, receberia as ideias ali divulgadas como “um golpe” à religião. O livro “Os Intelectuais e o Espiritismo”, de Ubiratan Machado (Publicações Lachâtre) registra “a resposta ácida e imediata” da Igreja Católica à ação de Telles de Menezes. Em uma Pastoral, Dom Manuel Joaquim Silveira, bispo de Salvador, tratou de orientar os católicos acerca das “perniciosas doutrinas” e das “superstições perigosas e reprovadas” que ameaçavam “a salvação” de seus “amados filhos”. Mas, a reação da Igreja não abateu o jornalista baiano que, em carta dirigida ao bispo, ratificaria sua “fé católica” e sua “obediência” ao prelado, como “humilde ovelha de seu rebanho”. Entretanto, dizia, sua fé lhe impunha “o sagrado dever de patentear a razão” de sua adesão à “salutar e evangélica doutrina do espiritismo”.
Registrando o episódio, o autor de “Os Intelectuais e o Espiritismo”, consigna: “Os espíritas brasileiros continuavam dóceis católicos, apenas discordando de alguns dogmas, Faltava coragem para abandonar o regaço da mãe Igreja”.

O surgimento de “O Eco de Além-Túmulo”
Foi com o mesmo espírito expresso na carta ao bispo que o jornalista baiano, acompanhado de outros intelectuais da época, todos de origem e tradição católicas, publicou o primeiro jornal “espírita” brasileiro. Na edição inaugural, o articulista Ignacio José da Cunha, membro do Grupo, reportava-se a comunicações mediúnicas de um espírito que jurara “pelo sagrado nome de Maria Santíssima, e por Deus Todo Poderoso” ser efetivamente o “Anjo de Deus”. No mesmo artigo, Cunha assegurava que, segundo as comunicações recebidas, “a religião católica é a verdadeira religião de Deus” e que “o espiritismo faz com que todos se cheguem à religião católica”.
O jornal dirigido por Telles de Menezes ocupava-se destacadamente com assuntos relativos à mediunidade e à reencarnação, identificando esta com o dogma da “ressurreição da carne”, mas, em vários trechos ratificava dogmas católicos como os da Santíssima Trindade e da divindade de Jesus.

A opinião de Kardec
Na “Revista Espírita” de junho de 1869, Allan Kardec saudou o aparecimento de “O Eco de Além Túmulo”, elogiando a “grande coragem” de Olympio Telles de Menezes, ao lançar “num país refratário como o Brasil um órgão destinado a popularizar nossos ensinamentos”. Mas, acrescentava Rivail: “Para nós, o Espiritismo não deve tender para nenhuma forma religiosa determinada”, devendo “permanecer como uma filosofia tolerante e progressiva, abrindo seus braços a todos os deserdados, qualquer que seja a nacionalidade e a crença a que pertençam”.

Para conhecer melhor: As edições de “O Echo d’ Alêm Tumulo”, publicadas bimestralmente nos anos de 1869 e 1870, estão digitalizadas e disponibilizadas no site da hemeroteca da Biblioteca Nacional do Brasil:






O Regaço Materno
A ninguém é fácil deixar o regaço materno. Para Luis Olympio e seus companheiros, em pleno Século XIX, em um país onde a “mãe Igreja” detinha a condição de religião oficial, haveria de ser muito mais difícil. Allan Kardec reconheceu isso e até elogiou a coragem do jornalista baiano, convencido de sua necessidade de “contornar certas suscetibilidades”. (R.E.junho/69). Mesmo assim, não compactuou com o perfil religioso, no caso católico, que era imprimido ao nascente espiritismo brasileiro, e preferiu ratificar seu caráter filosófico, universal e progressista.
Decorridos 145 anos, no entanto, parece oportuno recordar memorável lição de outro cristão, verdadeiro fundador, aliás, do movimento que se constituiria na maior religião do Ocidente. Paulo de Tarso, em epístola aos coríntios, comparou os primeiros ensinamentos espirituais que a eles levara com o leite materno dispensado a crianças ainda inaptas a ingerir alimentos sólidos. Concitava, assim, os destinatários de sua carta a se tornarem adultos capazes de receber as novas verdades que lhes pretendia agregar.
Lastimavelmente, amplos setores da imprensa e do próprio movimento espírita comportam-se e induzem seus seguidores a pensar e agir e, também, a interpretar as leis da vida, como se na infância espiritual permanecessem. Na abordagem dos grandes temas doutrinários, na linguagem empregada, ou guardando postura de distanciamento das questões de nosso tempo, demonstram disposição de permanecer estacionados em patamares culturalmente superados. Desprezam, dessa forma, a essencial condição progressiva e progressista do espiritismo, sem a qual, segundo Kardec, ele se condenaria ao próprio suicídio.
Seria injusto dizer que não avançamos relativamente a algumas abordagens infantilmente primárias do assim chamado primeiro jornal espírita brasileiro. Mas, o espiritismo exige mais de nós. Convida a deixarmos o regaço materno e renascermos para um novo mundo de ideias e seus consequentes desafios. Em outras palavras: é tempo de dispensar o doce leite da religião e alimentarmos o espírito com a sólida realidade da vida, que exige profundidade de pensamento e concretude de ação em favor do progresso científico, intelectual e ético da humanidade. O espiritismo, parece-nos, é ferramenta poderosa, apta a contribuir com esse objetivo. (A Redação).
         




Um encontro nos jardins do Vaticano
“É preciso coragem para dizer sim ao encontro e não ao confronto”. Papa Francisco

Um dado histórico instigante: as guerras religiosas, as perseguições por motivo de crença, o fundamentalismo e a intolerância religiosa são fenômenos bem mais comuns nas religiões monoteístas que naquelas de matriz politeísta.
A História, da Antiguidade à Modernidade e desta à contemporaneidade, está pontilhada de conflitos entre judeus e cristãos, cristãos e muçulmanos, muçulmanos e judeus e, mesmo, entre diferentes vertentes dessas mesmas crenças, como, por exemplo, católicos e protestantes, xiitas e sunitas. Judaísmo, cristianismo e islamismo se constituem nas três grandes religiões monoteístas do Planeta. A divindade que cultuam têm características comuns: é um deus pessoal, voluntarioso, que privilegia a fé sobre todas as demais virtudes. Seguros de a terem recebido como revelação, cada um desses três grupos religiosos se entende detentor da verdade. A gênese do direito e dos costumes desses povos parte de algumas “verdades” fundamentais que, por serem de “origem divina”, deverão reger suas relações internas e externas. A partir daí, organizaram-se comunidades, povos e nações que, diante da suposta posse da “verdade eterna”, tendem a menosprezar as demais, dando lugar à discriminação, ao ódio racial e religioso, aos conflitos e às guerras, que se estendem, às vezes, por séculos.
A modernidade laica e secular, com toda a razão, diante das características acima resumidas, vislumbrou nas religiões monoteístas um significativo fator de intolerância.
O atual chefe da Igreja Católica, um humanista, parece também ter percebido isso e está envidando esforços no sentido de estender pontes de diálogo entre as três grandes religiões monoteístas e os povos que as cultivam. Notadamente, busca aliviar a tensão política entre dois povos que, há décadas, sustentam graves conflitos com origens ligadas a questões raciais e religiosas: israelenses e palestinos.
Após visita à Palestina, no mês último, Francisco reuniu nos jardins do Vaticano, dia 8 de junho, os presidentes da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, e de Israel, Shimon Peres, convidando-os a orar juntos em favor da paz. Foi um ato carregado de simbolismo e de ideias generosas, perceptíveis no semblante dos quatro líderes mundiais participantes, eis que presente, ainda, o patriarca de Constantinopla, Bartolomeu I, da Igreja Cristã Ortodoxa.
O acontecimento tem profundo significado político, plenamente sintonizado com os ideais modernos em favor da paz, do igual respeito a todas as culturas e etnias e de cooperação entre todos os povos. Mais do que isso, entretanto, a humanidade espera daqueles que governam as nações onde persistam conflitos com essas conotações históricas: que suas eventuais crenças e tradições religiosas não sejam, jamais, empecilhos ao pleno exercício dos direitos fundamentais do ser humano, independentemente de credo, ideologia ou etnia.
É possível que o processo para se atingir esse estágio político, tanto no âmbito interno das nações, como no das relações internacionais, passe pela necessidade de se repensar conceitos teológicos arraigados em algumas culturas de tradição monoteísta. Fez bem o Papa em promover esse encontro nos jardins do Vaticano, ambiente neutro, laico, embora situado nos domínios da Santa Sé. É tempo de crentes, politeístas ou monoteístas, compreenderem que valores como dignidade humana, fraternidade, respeito ao pensamento alheio, alteridade, autonomia das pessoas e autodeterminação dos povos, não são inerentes a uma crença ou produtos de revelações divinas exclusivistas. São expressões da lei natural, paulatinamente assimilável e exercitável pelo espírito em sua caminhada evolutiva.
Nós, espíritas, defendemos ser a lei natural compatível com uma visão não pessoal ou antropomórfica de divindade, harmônica com a razão, fagulha emanada de uma Inteligência Suprema, causa primária de todas as coisas, que ilumina, igualmente, infinidade de inteligências, cooperadoras e ativas, que povoam o Universo. Essa concepção, espiritualista, racionalista e plural, conduz aos mesmos valores civilizatórios da sociedade moderna, secular e laica. Leva, especialmente, à convicção de que a Humanidade é constituída de uma única família e de que somos todos irmãos, independentemente de raças, credos e culturas.


         



A dúvida de Agostinho
Religião é certeza. Filosofia é dúvida. Fico, às vezes, a pensar na angústia de um Santo Agostinho, tão devotado à fé e, ao mesmo tempo, tão envolvido pela reflexão filosófica. Cristão convertido, devia obediência a Paulo que pregava a certeza de uma vida única, depois da qual viria o juízo. Mas, platônico, e conhecedor das ideias sobre a preexistência da alma, legadas por Orígenes, Plotino e outros neoplatônicos, “Padres da Igreja”, o bispo de Hipona, em suas “Confissões”, rogava a Deus: “Dizei se minha infância sucedeu a outra idade já morta, ou se tal idade foi a que levei no seio de minha mãe?”. E, angustiado, insistia: “E antes desse tempo, que era eu, meu Deus? Existi, porventura, em qualquer parte, ou era por acaso alguém?”.
Era o conflito entre a prisão da fé e os apelos libertários da filosofia.

A rebeldia de Bruno
Imagine-se um frade da ordem dos dominicanos, congregação religiosa que exige de seus membros, além dos votos de pobreza e de castidade, o da obediência. Era o Século XVI, e a Igreja vivia o período da Contrarreforma, buscando manter, a qualquer custo, seu poder sobre a sociedade europeia. Que chance poderia ter Giordano Bruno, conservando-se cristão, de sustentar coisas como pluralidade de mundos habitados e pluralidade de existências corporais do espírito? Mesmo abandonando o hábito, para se tornar, primeiramente, calvinista e, finalmente, livre-pensador, foi perseguido e processado pelo tribunal da Inquisição. Eram graves demais suas “heresias”, e, entre elas, particularmente perniciosa aquela que apregoava a “transmigração das almas”. O ex-frade, então excomungado, sustentou firmemente suas ideias, até ser calado pela infame execução, na fogueira, em praça pública, no “Campo dei Fiori”, em Roma, naquele 17 de fevereiro de 1600.

A certeza de Ford
Homem prático, inteligente, empreendedor, Henry Ford se tornaria um dos sujeitos mais ricos do mundo, desde que construiu seu primeiro automóvel. Mesmo com poder e dinheiro, segundo revelou, em 1929, em entrevista a um jornal americano, sentia-se, desde jovem, “aturdido”, diante de perguntas que fazia a si próprio, do tipo: “Para que estamos aqui?”. Sem resposta a essa indagação “a vida era vazia, inútil”. Foi quando, com a leitura de livro ofertado por um amigo, teve contato com as ideias reencanacionistas: “Isto mudou toda a minha vida”, declarou, que passou “do vazio e da inutilidade para uma existência de propósito e significação”. E acrescentou o grande industrial estadunidense: “Acredito que estamos aqui, e agora, e tornaremos a voltar. Disso eu tenho certeza”.

A coragem de Stevenson
Da Antiguidade aos dias de hoje, escritores, homens de ciência, poetas e filósofos aceitam a tese da existência do espírito e sua evolução através das vidas sucessivas. Hoje, não são poucos os intelectuais com essa íntima convicção. Mas, se veem frente a um impasse: a ciência acadêmica adotou paradigma materialista, reducionista. Ideias como imortalidade do espírito e reencarnação foram empurradas para o domínio da crença. Um professor universitário, um cientista, pode ter a fé que desejar. Mas, para estar inserido no “status quo” vigente, não deve “misturar” a “crença” com seu magistério ou atuação científica.  Por sorte, há exceções. O psiquiatra Ian Stevenson (1917/2007), professor da Universidade de Virginia, defendeu a hipótese da reencarnação e pesquisou faticamente sua ocorrência, deixando bem documentados os resultados na obra “Vinte Casos Sugestivos de Reencarnação”. Entretanto, esta frase dita por ele permite avaliar a coragem que precisou ter para realizar seu trabalho: “Se os hereges pudessem ser queimados vivos, nos dias de hoje, os cientistas – sucessores dos teólogos que queimavam qualquer um que negasse a existência das almas, no Séc.XVI – hoje queimariam aqueles que afirmam que elas existem”.





O suposto plágio de Allan Kardec
Eugenio Lara, arquiteto e designer gráfico; Membro-fundador do Centro de Pesquisa e Documentação Espírita, editor-fundador do site PENSE – Pensamento Social Espírita. E-mail: eugenlara@hotmail.com/ .

Durante o processo de desenvolvimento do Espiritismo, o pedagogo francês Denizard Rivail percebeu a necessidade de lançar mão de novas palavras, seja a partir das informações dos espíritos ou de seu conhecimento do grego e latim, línguas-mãe que dão origem a quase todas as palavras latinas. Criou uma nova terminologia, as palavras espiritismo, espírita e espiritista para designar o novo conjunto de ideias que havia estruturado em parceria com os espíritos.
No entanto, desde 1853, tais palavras já existiam no inglês, empregadas no francês com o lançamento de O Livro dos Espíritos (1857). Obviamente que para os inimigos do Espiritismo, velados, enrustidos ou declarados, este seria mais um motivo para espinafrar e desqualificar Denizard Rivail e todo seu legado. Ora, se já existia a palavra, então foi plágio, foi cópia descarada. Rivail seria um intelectual desonesto por conta deste fato e outras acusações mais, dando suposta razão a desertores e dissidentes precipitados, imprudentes e levianos.
Rivail era poliglota e conhecia o inglês. Lembremos que ele foi amigo íntimo da jornalista e tradutora inglesa Anna Blackwell, que foi correspondente da Revista Espírita, na Inglaterra. Não sabemos o grau de fluência que ele possuía desse idioma e menos ainda se teve acesso às obras inglesas contendo as “palavras novas”, os “neologismos” espírita e espiritismo no início de suas pesquisas.
Podemos observar a incidência do termo spiritism no livro raro Spirit Rapping Unveiled! escrito em 1853 pelo norte-americano Rev. Hiram Mattison (1811-1868). Há também a obra de Leonard Marsh (1800-1870), Apocatastasis, or Progress Backwards, editada em Burlington, por Chauncey Goodrich e o livro The Spirit-Rapper: an Autobiography (Boston, Little, Brown & Company, 1854), de Orestes Augustus Brownson (1803-1876). Spiritism era um termo comumente usado de modo pejorativo entre os espiritualistas, adeptos do New Spiritualism.
Certamente, Rivail não teve acesso a esses livros, ao menos na época em que lançou O Livro dos Espíritos. Isto porque a obra de Orestes Augustus Brownson é citada no opúsculo Catálogo Racional das Obras para se Fundar uma Biblioteca Espírita (1869). Temos de considerar que o contexto histórico era bem outro. Hoje, com a internet e as redes sociais, as informações fluem e não há mais desculpa a não ser a ignorância e preguiça em acessa-las. Isso não era possível na época.
Quando faz referência aos neologismos espiritismo, espírita e espiritista, Rivail deixa claro que foram criados por ele, devido à necessidade de dar uma identidade toda própria à filosofia espírita em seu nascedouro, a fim de não confundir com o Spiritualism norte-americano e inglês.
Na introdução de O Livro dos Espíritos, Rivail tece esclarecimentos sobre o tema:
“Em lugar das palavras espiritual e espiritualismo empregaremos, para designar esta última crença, as palavras espírita e espiritismo, nas quais a forma lembra a origem e o sentido radical e que por isso mesmo tem a vantagem de ser perfeitamente inteligíveis, deixando para espiritualismo a sua significação própria.” (item I, trad. Herculano Pires, LAKE).
Se Rivail criou ou não esses neologismos, tal dúvida se desfaz na leitura de uma pequena nota de rodapé escrita por ele em O Livro dos Médiuns, a respeito da terminologia utilizada nesta obra:
“Vemos que, quando se trata de exprimir uma ideia nova, para qual a língua não possui termo, os Espíritos sabem perfeitamente criar neologismos. Estas palavras: eletro-medianímico, perispirítico, não são nossas. Aqueles que nos criticaram por havermos criado as palavras espírita, espiritismo, perispírito, que não tinham termos análogos, poderão agora fazer a mesma crítica aos Espíritos.” (cap. V, item 98, trad. Herculano Pires, LAKE).
Para ideias novas, palavras novas foi o princípio, hoje semiótico, que Rivail adotou para criar a terminologia espírita, condição sine qua non à existência de qualquer ciência, por mais pretensiosa que seja.
Sem dúvida, foi uma sacada genial a criação de neologismos, principalmente os que definem e identificam a Doutrina Espírita. Desde seu início, por conta deste fato, o Espiritismo surge em meio a todo aquele movimento espiritualista e esotérico, com identidade própria, com suas especificidades, notadamente pelo fato de aderir à reencarnação, rejeitada por espiritualistas ingleses e norte-americanos. Se as palavras que criou tinham inicialmente no inglês sentido pejorativo, na medida em que o Espiritismo foi mostrando à sociedade suas finalidades e objetivos sérios, os termos ganharam outra conotação, outro significado.
Diante daquele conjunto de ideias que estruturou, faltava um nome e uma conceituação. E isso Rivail o fez como observamos nestas palavras: “Como especialidade o Livro dos Espíritos contém a Doutrina Espírita; como generalidade liga-se ao Espiritualismo, do qual representa uma das fases. Essa a razão porque traz sobre o título as palavras: Filosofia Espiritualista.” (O Livro dos Espíritos, introdução).
De certa forma, dar o nome a alguma coisa é quase o mesmo que inventar, criar ou fundar essa mesma coisa. A significação e o sentido conceitual que Kardec atribuiu às novas palavras reafirmam o fato de que foi ele quem fundou o Espiritismo, portanto, coube-lhe a responsabilidade e o mérito de organizar o conjunto terminológico adequado à nova ciência.
Se as palavras espírita, espiritismo já existiam, mesmo que em outro idioma, isso não tem a menor importância epistemológica diante do contexto histórico bastante diferenciado. Afinal, até 1857, o Espiritismo não existia e passou, desde então, a ter o status de uma nova filosofia espiritualista. E os termos usados no inglês não correspondem conceitualmente às designações futuramente criadas pelo fundador do Espiritismo.
Pode-se dizer que, sem o saber, Rivail se apropriou de termos existentes, imaginando tê-los criado, sem que houvesse aí algum tipo de desonestidade, de leviandade intelectual ou simplesmente plágio. Historicamente falando, as palavras espírita, espiritismo tornaram-se propriedade do Espiritismo, são o seu trademark, ficaram registradas para a posteridade com novas significações e acepções. Quando são pensadas, citadas e proferidas, tais palavras estão associadas historicamente a Denizard Rivail, sob o pseudônimo de Allan Kardec. Quem é que irá lembrar dos autores ingleses citados no início deste artigo? Quem os conhece? Quem são eles? Tiveram o mérito de usar a palavra spiritism pela primeira vez, mas sem seu significado vindouro, específico e bem definido que foi por Rivail. Foi ele quem fez a diferença e delimitou campos de conhecimento a partir dessas palavras. Se já existiam, isso não faz a menor diferença.





Signates e a Ciência da Religião
Um dos mais qualificados intelectuais espíritas brasileiros, Luiz Signates(foto) (Goiânia/GO), doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo, com pós-doutorado em epistemologia da comunicação, pela Unisinos, está iniciando importante atividade na Pontifícia Universidade Católica de Goiás. A partir do segundo semestre letivo deste ano de 2014, Signates passa a ser docente efetivo do Programa de Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) em Ciências da Religião daquela universidade.
Segundo informou a este jornal, o Prof. Signates vai se integrar à linha de pesquisas em “Cultura e Sistemas Simbólicos” daquele programa, onde se dedicará a estudos do espiritualismo brasileiro, em suas diferentes formas, “inclusive as suas formas laicas e de pretensão científica”. Acrescentou Signates: “Em meus últimos trabalhos, apresentados aos eventos desse programa, com o qual venho me relacionando nos últimos quatro anos, tenho citado a CEPA como um aspecto do espiritismo que merece uma atenção específica, por suas características antropológicas”. Ele entrevê nessa oportunidade profissional “também a possibilidade de contribuir, com apoio institucional, à consolidação de uma tradição de pesquisas sobre a temática espírita/espiritualista, em suas diferentes modalidades, tanto pela interlocução que possamos passar a ter, quanto pela formação, em níveis de mestrado e doutorado, de docentes e pesquisadores nessa área”.

Estudo Analítico de “O Livro dos Espíritos”
Sempre com boa frequência, segue se desenvolvendo, às sextas-feiras, a partir das 3 horas da tarde, no Centro Cultural Espírita de Porto Alegre (Rua Botafogo, 678), o chamado estudo analítico de O Livro dos Espíritos. A iniciativa e coordenação é do diretor do Departamento Doutrinário do CCEPA, Salomão Jacob Benchaya. O grupo, que conta com a participação de Maurice Herbert Jones, como provocador dos temas em debate, pode ser visitado, livremente, e sem compromisso de frequência, por todos os interessados, espíritas ou não.






A Consciência de um novo tempo
Estimados companheiros do CCEPA:
Em primeiro lugar parabenizo-os pela qualidade do Jornal Opinião e suas relevantes matérias, cujos conteúdos fazem a diferença no movimento espírita brasileiro e, quiçá, mundial, já que representam, literalmente, um movimento e refletem uma dinâmica progressista, em contraposição ao tradicional e estagnado modelo da esmagadora maioria das instituições espíritas brasileiras.
A propósito, confesso que muito refleti sobre a frase final de “Nossa Opinião”: “... porque afinado com a consciência de um novo tempo.” (edição n.219, de junho). Ficou martelando em minha mente a pergunta: o que seria a “consciência de um novo tempo”? Não tenho a resposta, mas sim a convicção sobre a pertinência do tema “O Espiritismo e os Desafios do Século XXI” para o VI Fórum do Livre-Pensar Espírita, em que tal consciência poderá ser intensamente debatida.
Grande abraço.

Néventon Vargas - João Pessoa-PB.

Um comentário:

  1. Creio que é preciso fazer uma retificação quanto a edição da Revista Espírita em que "O Eco de Além Túmulo" é anunciado. Na verdade, este anúncio aparece na edição de novembro de 1869 e não na de junho. É importante destacar também que as opiniões que se seguem ao anúncio são dos novos editores da Revista já que Kardec desencarnara há alguns meses. De toda a forma, estes são apenas pequenos detalhes que não influem na essência das ideias apresentadas nos textos que, aliás, estão excelentes. Parabéns!

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