Foi a partir de sua redemocratização que o Brasil começou a perceber mais claramente o elevado nível de criminalidade existente em suas elites políticas e econômicas, historicamente protegidas pela impunidade.
A assim chamada “criminalidade
do colarinho branco” passou a merecer, então, melhor atenção dos organismos de
investigação, persecução criminal, submissão ao devido processo legal e
julgamento. Ao mesmo tempo, pois, que o exercício democrático se abria para
todas as camadas da população, ensejando mais amplamente o acesso ao poder
também às classes sociais menos favorecidas, a criminalidade, de igual forma,
mostrava-se presente na ação de representantes políticos de todos os segmentos
sociais, incluindo aqueles antes tidos como “acima de qualquer suspeita”.
Na verdade, o crime não tem
ideologia nem partido, não é característica deste ou daquele estrato social,
político, religioso, civil ou militar. É doença contagiosa que se alastra,
contaminando segmentos ricos e pobres, criando mecanismos complexos,
estratégias para burlar a lei, e formando organizações poderosas com alto grau
de especialização. Membros desses organismos criminosos paraestatais, provindos
de todos os níveis, não raro, conquistam importantes fatias de poder, em todos
os segmentos do Estado, sob o hipócrita manto da democracia e mediante uma
falsa retórica de promoção do bem comum.
Mesmo assim, a parte boa e sadia
da sociedade é mais numerosa do que essa horda de criminosos que toma de
assalto setores do poder estatal e econômico. A grande maioria dos brasileiros
é constituída de homens e mulheres bem-intencionados, voltados a atividades
honestas: pais e mães de família; empresários e trabalhadores; governantes,
parlamentares, membros de Poderes, probos, imbuídos dos mais sãos princípios em
favor da ordem, da justiça, da paz social. Todos querendo oferecer sua
contribuição em prol de uma sociedade justa e harmônica.
Apesar disso, já ao tempo da
estruturação filosófica do espiritismo, seu insigne fundador, Allan Kardec,
percebeu que, como ocorre hoje, em amplos setores da política e das engrenagens
que movem as relações sociais, a “influência dos maus sobrepuja a dos bons”, e
questionou os espíritos sobre a razão desse fenômeno. Deles recebeu esta
resposta, na questão 932 de O Livro dos Espíritos:
“Por fraqueza destes (os bons). Os maus são
intrigantes e audaciosos, os bons são tímidos. Quando estes o quiserem,
preponderarão”.
No cenário pátrio atual, a
“fraqueza dos bons” tem se consubstanciado, às vezes, mais do que pela inação
ou a timidez destes, pela própria incapacidade de reconhecerem que estão sendo
enganados. Assim, por exemplo, quando um político prega o retorno à ditadura,
acenando com a possibilidade de esta trazer a paz social, pessoas de boa
índole, poderão sucumbir a essa retórica enganosa, totalmente distanciada da
real experiência histórica.
A “fraqueza dos bons”, que tanto
atraso já causou à humanidade, tem, pois, componentes de ingenuidade, de
ignorância política, de ausência dos conhecimentos amealhados ao longo da
formação política e social da espécie humana. Ditaduras, sejam de direita ou de
esquerda, sempre foram altamente nocivas à sociedade. Ferem a dignidade do
cidadão, atentando contra seus direitos naturais.
A democracia, mesmo que
teoricamente concebida há séculos, pelos gregos, é, na prática, conquista
recente da História, e consolida-se na medida que se protege dos embustes
gerados em seu próprio seio. Ela requer, acima de tudo, persistência e coragem
no seu exercício, que deverá ser iluminado pela ética do diálogo, da tolerância,
do respeito, da sabedoria e da fraternidade, tendo por fim o bem comum.
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