Carta de Posicionamentos consolida
Pensamento da CEPA no Brasil
Um terreno neutro em questões religiosas
O documento aprovado no II Encontro Nacional da CEPABrasil (Bento Gonçalves/RS, 3 a 6 de setembro 2010) defende que conceitos como “3ª Revelação Divina”, “Consolador Prometido” ou “Revivescência do Cristianismo Primitivo” não se ajustam a uma visão moderna da teoria espírita e são de natureza sectária e excludente. Reafirma, no entanto, a importância do pensamento de Jesus de Nazaré cujos conceitos de validade universal estão expressos em linguagem e parâmetros compatíveis com a modernidade na 3ª parte de “O Livro dos Espíritos”. A carta esclarece que “laico não é antirreligioso” é apenas “arreligioso”, ou seja “um terreno neutro em questões religiosas”.
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Atualização, união e compromisso social espírita
Reafirmando todos os princípios fundamentais do espiritismo – existência de Deus, imortalidade da alma, comunicabilidade entre encarnados e desencarnados, reencarnação, pluralidade dos mundos habitados e evolução infinita - o documento aprovado pela Associação Brasileira de Delegados e Amigos da CEPA enfatiza a necessidade de atualização permanente do espiritismo, como recomendara Kardec.
A carta ratifica a posição da CEPA no sentido de que as instituições espíritas cultivem e estimulem a liberdade de pensamento, de ação e de autogestão. Advoga o pluralismo de ideias em torno do essencial, entendendo que o vigente modelo de “unificação”, com a supremacia de um pensamento único, conflita com o caráter livre-pensador do espiritismo. Deplora a submissão a pretensas determinações da chamada “espiritualidade superior”, discurso que confunde o espiritismo, “transformando-o numa doutrina evangélica, religiosa, com algum suporte na obra de Kardec, mas sem a racionalidade por ele proposta”. Vinculando o espiritismo às “correntes mais avançadas do pensamento humanista e social”, o documento convida os espíritas a uma ação efetiva em prol da democracia, da paz, da igualdade social, da preservação do meio ambiente e contra todas as formas de autoritarismo e corrupção.
Para saber mais: a íntegra da Carta de Posicionamento da CEPABrasil pode ser lida no site http://www.cepainfo.org/
Nossa Opinião
Espiritismo, necessariamente progressista
“Não vês (...) que te renovas todo o dia, no amor, na tristeza, da dúvida, no desejo, que és sempre outro, que és sempre o mesmo.” O poema de Cecília Meireles, lembrado na conferência de abertura do II Encontro Nacional da CEPABrasil, bem que pode ser a síntese dos esforços dos companheiros ali reunidos.
A maioria deles já pertenceu e até já dirigiu instituições estanques, presas a uma cartilha inalterável e inquestionável de conceitos e procedimentos. Lá, reproduziram modelos cristalizados em suas almas, nutrindo corpos institucionais supostamente investidos da atribuição de guardiões da verdade. Esta teria como fonte a própria divindade, revestida, pois, de caráter absoluto. Os intérpretes dessa verdade, assim chamados “espíritos superiores”, só intermediados por médiuns rigorosamente fieis àquele “status quo” institucional, seriam a instância única a homologar todo e qualquer desdobramento conceitual.
Uma releitura dos princípios fundamentais espíritas, inteiramente aceitos pelos companheiros presentes em Bento Gonçalves, conduziu-os a uma postura diferenciada. Renovar, entendem, é fazer-se outro, preservando sua mesma identidade. É reconhecer-se essencialmente humano, por suas dúvidas, sua falibilidade e, especialmente, por seus desejos de mudança.
Uma instituição que congrega espíritas com esse perfil e reconhece, precipuamente, a condição humana de seus colaboradores, encarnados ou desencarnados, mesmo que o objeto de seus esforços seja a busca dos valores eternos e imutáveis, é um segmento merecedor da qualificação de progressista. Adjetivo do qual não pode prescindir o espiritismo. (A Redação).
Editorial
Uma orquestra muito afinada
A música é a linguagem dos espíritos.
Khalil Gibran
A figura da orquestra foi sugerida, pela primeira vez, no Congresso de Porto Alegre (2000), como símbolo dos esforços do segmento espírita congregado pela CEPA. Mensagem ditada pelo espírito Manuel S.Porteiro à médium Yolanda Polimeni, na ocasião, enfatizava:
“Nota a nota compõe-se a sinfonia. Assim, no grande concerto da vida universal, cada nota representa um pensamento que procura a verdade e o amor como expressão da harmonia.
Cantar num só coro não significa entoar o mesmo tom, a mesma voz, no mesmo tempo. Ao contrário, o coro se compõe de vozes, de sons diversos, de tons variados para que expressem a beleza.
O Espiritismo é como a canção universal, entoa as notas da ciência, da filosofia e do amor para compor a harmonia dos que buscam as verdades que conduzirão o espírito humano a dimensões não imagináveis, mas de imensa felicidade”.
Quatro anos após, no Congresso de Rafaela, Porteiro parece continuar a mensagem de 2000, ditando à mesma médium estas frases:
“Vejo que os músicos afinam seus instrumentos e ensaiam a melodia. A orquestra está pronta para executar a canção e a canção será bela. Será uma canção de amor que inundará todos os corações, que fará todos felizes e nos permitirá sorrir, porque fizemos a nossa parte. Cantemos, amigos, cantemos esta bela canção que se chama Trabalho, Tolerância e Fraternidade”.
Talvez não por mera coincidência, agora, no II Encontro Nacional da CEPABrasil, ao ser pedido a Sandra Regis que organizasse uma atividade lúdica de encerramento, ela ensaiou em tempo recorde e convidou todos os participantes a cantarem em coro “A Orquestra”, uma linda canção, por ela adaptada do cancioneiro argentino.
Depois, em depoimento a este jornal, Sandra, que regeu por muitos anos o coral do Centro Espírita Allan Kardec, de Santos, comentou a experiência que consiste em separar as várias vozes, cada uma delas imitando um instrumento de uma orquestra. Diz Sandra: “O resultado é sempre maravilhoso! É um exemplo de que podemos ter ‘melodias’ diferentes, mas sempre encontramos notas iguais no decorrer da melodia e, ao final, entoaremos a mesma nota, alcançado nosso uníssono harmônico”.
Ao enfrentar o tema da identidade do espiritismo, o II Encontro Nacional da CEPABrasil tinha exatamente esse propósito: estimular a união dos espíritas, a partir da harmonia sugerida pelas leis universais que constituem a base filosófica comum a todos eles. Kardec chamou isso de “comunhão de pensamento”. Essa harmonia é tecida de várias notas, de tons e semitons que ecoam nos diferentes cenários onde se cultivam as ideias espíritas.
Pensamos apenas que há uma pauta da qual não nos é lícito sair, se pretendemos continuar nos afirmando espíritas. Com esse evento, os núcleos brasileiros que se identificam com a CEPA desejaram contribuir buscando explicitar essa pauta. Para que sobre ela todos os espíritas sigam compondo, plural e harmonicamente, a melodia dessa mensagem universal chamada espiritismo. Se logramos algum avanço só o tempo poderá dizer.
A harmonia é tecida de várias notas, mas há uma pauta da qual não nos é lícito sair, se pretendemos continuar nos afirmando espíritas.
Opinião do leitor
Recebimento de CCEPA Opinião
Como responsável pela parte administrativa da Sociedade Espírita Novo Horizonte, comunico aos senhores nossa Caixa Postal, de número 114, para onde deverá continuar sendo enviado o jornal. Nossa intenção é a de continuar recebendo CCEPA Opinião, pois entendemos a importância dessa entidade no aprofundamento dos estudos espíritas. Mais uma vez agradecemos a gentileza do envio. Gostaríamos de cada vez mais estreitar o nível de comunicação com essa entidade. Assim, solicitamos a gentileza de sempre que tiverem novidades (como, por exemplo, a realização do II Encontro Nacional da CEPABrasil e outras atividades), que, por favor, nos informem, pois teremos o maior interesse em participar.
Carlos Cesar Machado Alves
Vice-Presidente Da Sociedade Espírita Novo Horizonte – Capão Novo – Capão da Canoa/RS
Opinião em Tópicos
Milton R.Medran Moreira
Nosso Lar
A crítica
Minha amiga Nícia Cunha viu e não gostou. Na lista da CEPA, comentou na forma franca como é de seu estilo. Acha que a dimensão espiritual foi mostrada como “um umbral escuro, nojentamente enlameado e com espíritos sofredores feridos, vagando sem rumo”. Na colônia espiritual que deu nome à obra, “todo mundo piegas, com aqueles camisolões brancos, falas professorais, sem argumentação lógica”. A tônica presente, segundo Nícia, é a de sempre: “Mais tarde você compreenderá tudo”.
A crítica especializada, de maneira geral, tem elogiado os efeitos especiais, muito bem utilizados, à moda hollyoodiana. Mas não tem poupado críticas ao caráter piegas da produção. Na Folha de São Paulo, o crítico Gustavo Fioratti comenta que “retratar o mundo dos mortos com um cenário cheio de flores, gramados ensolarados e cheio de personagens que usam roupas esvoaçantes é apostar num velho clichê”. (Folha Ilustrada – 3/9).
Batas ou jeans?
Em áudio veiculado no site da Folha, Fioratti diz não entender porque nessas colônias espirituais, mostradas em novelas e filmes do gênero, nunca chove. E o que mais o intriga é por que um espírito desencarnado tenha de andar sempre com aquelas batas “em tons pastéis, variando entre o bege e o lilás”. Pergunta: que mal teria se eles se apresentassem com uma calça jeans bem cortada ou uma minissaia?
Claro que o cineasta e nem o autor das novelas da Globo não podem levar as culpas disso. É assim mesmo que as obras espíritas vêm, sistemática e invariavelmente, retratando o mundo espiritual. Aí cabe uma importante reflexão espírita: no fundo, a ideia de imortalidade que o espiritismo prega, modelada por obras mediúnicas dos anos 40, pouco se afastou do estereótipo céu/inferno/purgatório, do catolicismo.
Estereótipos
“Nosso Lar”, “Brasil, Coração do Mundo e Pátria do Evangelho” e tantas outras obras mediúnicas que moldaram o espiritismo brasileiro podem não passar de meras criações de ficção de seus autores espirituais. Ou será proibido fazer ficção na espiritualidade? Mesmo, contudo, que o famoso livro de André Luiz retrate um lugar real, uma colônia situada no espaço espiritual do Rio de Janeiro, por que deveremos tomá-la como uma realidade universal? No mundo material, também há colônias religiosas onde seus habitantes andam de batas, longos camisolões, batinas ou hábitos. Nem por isso, a Terra é um grande mosteiro ou um imenso Vale do Amanhecer. Cabe a nós, espíritas, derrubar esses estereótipos. Meta na formação de nossos médiuns, engajados em uma concepção laica, humanista e universalista da realidade espiritual. Quando isso for possível, hão de emergir, sim, em profusão, colônias espirituais onde seus habitantes trajam jeans bem cortados e minissaias. E nem por isso deixarão de dar sua contribuição ética à humanidade encarnada.
Notícias
O chá que une o útil ao agradável
Desde o último mês de julho, o Centro Cultural Espírita de Porto Alegre – CCEPA – encontrou uma forma criativa de integração de seus grupos de estudo. Por iniciativa da dirigente Eloá Popoviche Bittencourt, bimensalmente é organizado um chá/café após as reuniões de estudo ou seminários, das quartas-feiras à tarde. Salomão Jacob Benchaya, Diretor Doutrinário da Casa classifica o chá das quartas como “confraternativo/arrecadativo”. Com o patrocínio de alguns associados e da Padaria Santo Antônio (Av.Getúlio Vargas, 178, Bairro Menino Deus) é possível oferecer, mediante a colaboração de 5 reais, um agradável lanche que oportuniza o encontro e a confraternização entre os membros do CCEPA, além de aliviar o sempre necessitado Caixa da Instituição.
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Ecos do II Encontro em Bento Gonçalves
Quem não pôde participar do II Encontro Nacional da CEPABrasil, organizado pelo Centro Cultural Espírita de Porto Alegre e patrocinado pela Associação de Delegados e Amigos da CEPA no Brasil, poderá ter um relato resumido do que ali foi discutido. No próximo dia 4 de outubro, no espaço destinado à conferência mensal da primeira segunda-feira do mês, Salomão Benchaya vai comentar o evento e sua temática.
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Enfoque
Antiga e velha, mas ainda tão nova
Wilson Garcia, escritor, jornalista e professor universitário, Recife/PE
Nossa Opinião
Espiritismo, necessariamente progressista
“Não vês (...) que te renovas todo o dia, no amor, na tristeza, da dúvida, no desejo, que és sempre outro, que és sempre o mesmo.” O poema de Cecília Meireles, lembrado na conferência de abertura do II Encontro Nacional da CEPABrasil, bem que pode ser a síntese dos esforços dos companheiros ali reunidos.
A maioria deles já pertenceu e até já dirigiu instituições estanques, presas a uma cartilha inalterável e inquestionável de conceitos e procedimentos. Lá, reproduziram modelos cristalizados em suas almas, nutrindo corpos institucionais supostamente investidos da atribuição de guardiões da verdade. Esta teria como fonte a própria divindade, revestida, pois, de caráter absoluto. Os intérpretes dessa verdade, assim chamados “espíritos superiores”, só intermediados por médiuns rigorosamente fieis àquele “status quo” institucional, seriam a instância única a homologar todo e qualquer desdobramento conceitual.
Uma releitura dos princípios fundamentais espíritas, inteiramente aceitos pelos companheiros presentes em Bento Gonçalves, conduziu-os a uma postura diferenciada. Renovar, entendem, é fazer-se outro, preservando sua mesma identidade. É reconhecer-se essencialmente humano, por suas dúvidas, sua falibilidade e, especialmente, por seus desejos de mudança.
Uma instituição que congrega espíritas com esse perfil e reconhece, precipuamente, a condição humana de seus colaboradores, encarnados ou desencarnados, mesmo que o objeto de seus esforços seja a busca dos valores eternos e imutáveis, é um segmento merecedor da qualificação de progressista. Adjetivo do qual não pode prescindir o espiritismo. (A Redação).
Editorial
Uma orquestra muito afinada
A música é a linguagem dos espíritos.
Khalil Gibran
A figura da orquestra foi sugerida, pela primeira vez, no Congresso de Porto Alegre (2000), como símbolo dos esforços do segmento espírita congregado pela CEPA. Mensagem ditada pelo espírito Manuel S.Porteiro à médium Yolanda Polimeni, na ocasião, enfatizava:
“Nota a nota compõe-se a sinfonia. Assim, no grande concerto da vida universal, cada nota representa um pensamento que procura a verdade e o amor como expressão da harmonia.
Cantar num só coro não significa entoar o mesmo tom, a mesma voz, no mesmo tempo. Ao contrário, o coro se compõe de vozes, de sons diversos, de tons variados para que expressem a beleza.
O Espiritismo é como a canção universal, entoa as notas da ciência, da filosofia e do amor para compor a harmonia dos que buscam as verdades que conduzirão o espírito humano a dimensões não imagináveis, mas de imensa felicidade”.
Quatro anos após, no Congresso de Rafaela, Porteiro parece continuar a mensagem de 2000, ditando à mesma médium estas frases:
“Vejo que os músicos afinam seus instrumentos e ensaiam a melodia. A orquestra está pronta para executar a canção e a canção será bela. Será uma canção de amor que inundará todos os corações, que fará todos felizes e nos permitirá sorrir, porque fizemos a nossa parte. Cantemos, amigos, cantemos esta bela canção que se chama Trabalho, Tolerância e Fraternidade”.
Talvez não por mera coincidência, agora, no II Encontro Nacional da CEPABrasil, ao ser pedido a Sandra Regis que organizasse uma atividade lúdica de encerramento, ela ensaiou em tempo recorde e convidou todos os participantes a cantarem em coro “A Orquestra”, uma linda canção, por ela adaptada do cancioneiro argentino.
Depois, em depoimento a este jornal, Sandra, que regeu por muitos anos o coral do Centro Espírita Allan Kardec, de Santos, comentou a experiência que consiste em separar as várias vozes, cada uma delas imitando um instrumento de uma orquestra. Diz Sandra: “O resultado é sempre maravilhoso! É um exemplo de que podemos ter ‘melodias’ diferentes, mas sempre encontramos notas iguais no decorrer da melodia e, ao final, entoaremos a mesma nota, alcançado nosso uníssono harmônico”.
Ao enfrentar o tema da identidade do espiritismo, o II Encontro Nacional da CEPABrasil tinha exatamente esse propósito: estimular a união dos espíritas, a partir da harmonia sugerida pelas leis universais que constituem a base filosófica comum a todos eles. Kardec chamou isso de “comunhão de pensamento”. Essa harmonia é tecida de várias notas, de tons e semitons que ecoam nos diferentes cenários onde se cultivam as ideias espíritas.
Pensamos apenas que há uma pauta da qual não nos é lícito sair, se pretendemos continuar nos afirmando espíritas. Com esse evento, os núcleos brasileiros que se identificam com a CEPA desejaram contribuir buscando explicitar essa pauta. Para que sobre ela todos os espíritas sigam compondo, plural e harmonicamente, a melodia dessa mensagem universal chamada espiritismo. Se logramos algum avanço só o tempo poderá dizer.
A harmonia é tecida de várias notas, mas há uma pauta da qual não nos é lícito sair, se pretendemos continuar nos afirmando espíritas.
Opinião do leitor
Recebimento de CCEPA Opinião
Como responsável pela parte administrativa da Sociedade Espírita Novo Horizonte, comunico aos senhores nossa Caixa Postal, de número 114, para onde deverá continuar sendo enviado o jornal. Nossa intenção é a de continuar recebendo CCEPA Opinião, pois entendemos a importância dessa entidade no aprofundamento dos estudos espíritas. Mais uma vez agradecemos a gentileza do envio. Gostaríamos de cada vez mais estreitar o nível de comunicação com essa entidade. Assim, solicitamos a gentileza de sempre que tiverem novidades (como, por exemplo, a realização do II Encontro Nacional da CEPABrasil e outras atividades), que, por favor, nos informem, pois teremos o maior interesse em participar.
Carlos Cesar Machado Alves
Vice-Presidente Da Sociedade Espírita Novo Horizonte – Capão Novo – Capão da Canoa/RS
Opinião em Tópicos
Milton R.Medran Moreira
Nosso Lar
Escrevo esta coluna quando se fecham as duas primeiras semanas de exibição do filme Nosso Lar. Um sucesso de bilheteria. Cerca de 2 milhões de brasileiros já assistiram ao filme. No momento em que você ler este comentário, o número poderá ter dobrado. Os espíritas, de modo geral, andam eufóricos. Depois do êxito do filme Chico Xavier, a produção de Wagner de Assis está contribuindo para tornar ainda mais popular a mensagem de Emmanuel/André Luiz, base do espiritismo cristão que ganhou milhões de adeptos neste Brasil, Coração do Mundo e Pátria do Evangelho (ou será dos evangélicos?). Há uma forte campanha para que “Nosso Lar” seja o candidato brasileiro ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Tenho estado atento a tudo o que dele se fala, no meio espírita ou fora dele.
A crítica
Minha amiga Nícia Cunha viu e não gostou. Na lista da CEPA, comentou na forma franca como é de seu estilo. Acha que a dimensão espiritual foi mostrada como “um umbral escuro, nojentamente enlameado e com espíritos sofredores feridos, vagando sem rumo”. Na colônia espiritual que deu nome à obra, “todo mundo piegas, com aqueles camisolões brancos, falas professorais, sem argumentação lógica”. A tônica presente, segundo Nícia, é a de sempre: “Mais tarde você compreenderá tudo”.
A crítica especializada, de maneira geral, tem elogiado os efeitos especiais, muito bem utilizados, à moda hollyoodiana. Mas não tem poupado críticas ao caráter piegas da produção. Na Folha de São Paulo, o crítico Gustavo Fioratti comenta que “retratar o mundo dos mortos com um cenário cheio de flores, gramados ensolarados e cheio de personagens que usam roupas esvoaçantes é apostar num velho clichê”. (Folha Ilustrada – 3/9).
Batas ou jeans?
Em áudio veiculado no site da Folha, Fioratti diz não entender porque nessas colônias espirituais, mostradas em novelas e filmes do gênero, nunca chove. E o que mais o intriga é por que um espírito desencarnado tenha de andar sempre com aquelas batas “em tons pastéis, variando entre o bege e o lilás”. Pergunta: que mal teria se eles se apresentassem com uma calça jeans bem cortada ou uma minissaia?
Claro que o cineasta e nem o autor das novelas da Globo não podem levar as culpas disso. É assim mesmo que as obras espíritas vêm, sistemática e invariavelmente, retratando o mundo espiritual. Aí cabe uma importante reflexão espírita: no fundo, a ideia de imortalidade que o espiritismo prega, modelada por obras mediúnicas dos anos 40, pouco se afastou do estereótipo céu/inferno/purgatório, do catolicismo.
Estereótipos
“Nosso Lar”, “Brasil, Coração do Mundo e Pátria do Evangelho” e tantas outras obras mediúnicas que moldaram o espiritismo brasileiro podem não passar de meras criações de ficção de seus autores espirituais. Ou será proibido fazer ficção na espiritualidade? Mesmo, contudo, que o famoso livro de André Luiz retrate um lugar real, uma colônia situada no espaço espiritual do Rio de Janeiro, por que deveremos tomá-la como uma realidade universal? No mundo material, também há colônias religiosas onde seus habitantes andam de batas, longos camisolões, batinas ou hábitos. Nem por isso, a Terra é um grande mosteiro ou um imenso Vale do Amanhecer. Cabe a nós, espíritas, derrubar esses estereótipos. Meta na formação de nossos médiuns, engajados em uma concepção laica, humanista e universalista da realidade espiritual. Quando isso for possível, hão de emergir, sim, em profusão, colônias espirituais onde seus habitantes trajam jeans bem cortados e minissaias. E nem por isso deixarão de dar sua contribuição ética à humanidade encarnada.
Notícias
O chá que une o útil ao agradável
Desde o último mês de julho, o Centro Cultural Espírita de Porto Alegre – CCEPA – encontrou uma forma criativa de integração de seus grupos de estudo. Por iniciativa da dirigente Eloá Popoviche Bittencourt, bimensalmente é organizado um chá/café após as reuniões de estudo ou seminários, das quartas-feiras à tarde. Salomão Jacob Benchaya, Diretor Doutrinário da Casa classifica o chá das quartas como “confraternativo/arrecadativo”. Com o patrocínio de alguns associados e da Padaria Santo Antônio (Av.Getúlio Vargas, 178, Bairro Menino Deus) é possível oferecer, mediante a colaboração de 5 reais, um agradável lanche que oportuniza o encontro e a confraternização entre os membros do CCEPA, além de aliviar o sempre necessitado Caixa da Instituição.
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Ecos do II Encontro em Bento Gonçalves
Quem não pôde participar do II Encontro Nacional da CEPABrasil, organizado pelo Centro Cultural Espírita de Porto Alegre e patrocinado pela Associação de Delegados e Amigos da CEPA no Brasil, poderá ter um relato resumido do que ali foi discutido. No próximo dia 4 de outubro, no espaço destinado à conferência mensal da primeira segunda-feira do mês, Salomão Benchaya vai comentar o evento e sua temática.
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Enfoque
Antiga e velha, mas ainda tão nova
Wilson Garcia, escritor, jornalista e professor universitário, Recife/PE
Codificador, autor, criador e até mesmo inventor são alguns dos termos utilizados para designar a relação de Allan Kardec com a Doutrina Espírita. Às vezes em tom de crítica à popularização do adjetivo codificador, que sem dúvida encontrou espaço maior no campo do movimento, às vezes por conta de estudos sérios que buscam compreender a doutrina lançada a público a partir de 1857, na França.
O mineiro Augusto Araújo tem debatido pelas listas da Cepa este e outros temas vinculados aos seus interesses de estudo, enquanto produz sua tese de doutoramento baseada “na leitura e interpretação da obra de Allan Kardec"1. Tem ele reiterado em algumas oportunidades não ser adepto do espiritismo, mas suas intervenções têm revelado sempre respeito e admiração e recebido por parte dos listeiros grande atenção e interesse, além do espaço de discussão bastante profícuo.
No texto que fez publicar no jornal Opinião abaixo mencionado, Araújo expõe suas razões histórico-metodológicas pelas quais entende ser Allan Kardec o autor da doutrina dos espíritos, preferindo este termo aos demais. Baseia-se num raciocínio lógico em que compara as produções filosóficas atribuídas aos pré-socráticos e aquela realizada por Allan Kardec no século XIX. Lamenta o desaparecimento das fontes utilizadas por Kardec (as comunicações dos espíritos), razão pela qual se sente impedido de reconhecer a face “científica” do espiritismo. Ou seja, já não se tem mais condições de analisar comparativamente o pensamento dos autores espirituais e o de Kardec no seu trabalho de produção da doutrina.
Por mais que os espíritas profundamente ciosos de suas crenças justifiquem a pouca importância que atribuem a isso, na opinião de que o conhecimento que a doutrina oferece tem valor maior, afirmando mesmo às vezes que é o que interessa, não se pode negar os fatos. Isso não diminui o valor do espiritismo, absolutamente, mas a lacuna deixada pelo desaparecimento das fontes primárias impede um trabalho mais amplo de análise comparativa. O caminho aí, portanto, embora não estacione, bifurca-se.
A questão da codificação-autoria levantada por Araújo permite outros raciocínios. O termo “codificador”, bastante criticado por alguns, não está em oposição ao que se conhece em comunicação na contemporaneidade. O termo sofreu desgastes, é verdade, com seu uso generalizado por incorporar outras significações, como, por exemplo, a ideia implícita de que o codificador foi apenas um ordenador cuja participação não passou deste limite, o que conferiria maior autoridade às mensagens originais e colocaria Kardec no papel de intermediário isento.
Em sua significação semântica o termo codificar é empregado para designar a ação de produzir mensagem através do código linguístico que deverá ser “decodificado” pelo destinatário. Em princípio, todo emissor é um codificador e todo destinatário é um decodificador. Mas a ideia de uma comunicação circular nos leva à compreensão de que emissor e destinatário se alternam nestas duas posições, ou seja, Kardec foi decodificador quando estudou as mensagens e codificador quando as ordenou. Nesse processo, evidentemente, sua intervenção deixou as marcas da sua individualidade mostradas pelas evidências.
Assim, Kardec terá sido um codificador ativo, participante e, como é consenso entre os espíritas, autorizado pelas fontes. Se na ausência dos documentos originais contendo as mensagens se afirmará que ele, Kardec, é o autor, para os espíritas deverá ser visto como co-autor, ou seja, o material fornecido pelas fontes espirituais recebeu a impressão do pensamento de Kardec.
Mesmo que Kardec tivesse sido uma espécie de coordenador passivo, ainda assim suas marcas estariam presentes no produto final, porque selecionar e ordenar o material implica em tomar decisões e fazer opções, incluir e excluir, dar voz e retirar a voz, o que, em última palavra, significa participar do e definir o produto final.
Kardec, porém, foi muito além disso. Foi também intérprete das vozes espirituais, liderou um processo, produziu questionamentos, direcionou temas, solucionou contradições, superou dilemas, concordou e discordou até chegar a um ponto consensual com as fontes espirituais.
Talvez aqui devamos tocar na transcrição que Araújo faz de um dos diversos trechos em que Kardec fala sobre a sua participação na obra doutrinária, texto que serve a Araújo para reforçar sua convicção sobre a posição autoral de Kardec. Ei-lo.
“Da comparação e da fusão de todas as respostas, coordenadas, classificadas, e muitas vezes retocadas no silêncio da meditação, foi que elaborei a primeira edição de O Livro dos Espíritos, entregue à publicidade em 18 de abril de 1857.”
Araújo questiona o emprego do verbo “retocar” como tradução do francês “remanier”, entendendo que maior precisão haveria se fosse usado o verbo reparar, modificar ou refazer. Apesar das justificativas etimológicas oferecidas por Araújo, parece-me que em nenhum desses casos, ou seja, o emprego de qualquer dos verbos sugeridos ou a manutenção do verbo escolhido pelo tradutor não resolveria a questão da intencionalidade de Kardec.
Não há como dimensionar a ação de Kardec em relação às mensagens por ele comparadas e fundidas, senão especular. Aqui, com certeza, o desaparecimento dos originais se torna mais significativo de ponto de vista do interesse do pesquisador, ao impossibilitar qualquer avanço no desejado estudo comparativo.
O que significa, de fato, comparar, fundir e retocar “no silêncio da meditação”? Qual é a extensão disso em relação às ideias e respostas dadas pelos autores espirituais? A declaração de Kardec tem o objetivo simples de chamar para si a responsabilidade do produto final ou vai além? Qualquer resposta objetiva aqui será mera conjectura.
Estou curioso com a tese que o Augusto Araújo está produzindo e pelo que tenho acompanhado deverá apresentar boa contribuição à compreensão do espiritismo. Da mesma forma, estou convicto de que a questão codificador-autor deveria ser vista com mais naturalidade, na perspectiva de que como codificador é também co-autor e como co-autor é ainda assim o codificador de uma mensagem tão complexa quanto extraordinária.
1 Jornal Opinião, p4, Porto Alegre, julho de 2010.
O mineiro Augusto Araújo tem debatido pelas listas da Cepa este e outros temas vinculados aos seus interesses de estudo, enquanto produz sua tese de doutoramento baseada “na leitura e interpretação da obra de Allan Kardec"1. Tem ele reiterado em algumas oportunidades não ser adepto do espiritismo, mas suas intervenções têm revelado sempre respeito e admiração e recebido por parte dos listeiros grande atenção e interesse, além do espaço de discussão bastante profícuo.
No texto que fez publicar no jornal Opinião abaixo mencionado, Araújo expõe suas razões histórico-metodológicas pelas quais entende ser Allan Kardec o autor da doutrina dos espíritos, preferindo este termo aos demais. Baseia-se num raciocínio lógico em que compara as produções filosóficas atribuídas aos pré-socráticos e aquela realizada por Allan Kardec no século XIX. Lamenta o desaparecimento das fontes utilizadas por Kardec (as comunicações dos espíritos), razão pela qual se sente impedido de reconhecer a face “científica” do espiritismo. Ou seja, já não se tem mais condições de analisar comparativamente o pensamento dos autores espirituais e o de Kardec no seu trabalho de produção da doutrina.
Por mais que os espíritas profundamente ciosos de suas crenças justifiquem a pouca importância que atribuem a isso, na opinião de que o conhecimento que a doutrina oferece tem valor maior, afirmando mesmo às vezes que é o que interessa, não se pode negar os fatos. Isso não diminui o valor do espiritismo, absolutamente, mas a lacuna deixada pelo desaparecimento das fontes primárias impede um trabalho mais amplo de análise comparativa. O caminho aí, portanto, embora não estacione, bifurca-se.
A questão da codificação-autoria levantada por Araújo permite outros raciocínios. O termo “codificador”, bastante criticado por alguns, não está em oposição ao que se conhece em comunicação na contemporaneidade. O termo sofreu desgastes, é verdade, com seu uso generalizado por incorporar outras significações, como, por exemplo, a ideia implícita de que o codificador foi apenas um ordenador cuja participação não passou deste limite, o que conferiria maior autoridade às mensagens originais e colocaria Kardec no papel de intermediário isento.
Em sua significação semântica o termo codificar é empregado para designar a ação de produzir mensagem através do código linguístico que deverá ser “decodificado” pelo destinatário. Em princípio, todo emissor é um codificador e todo destinatário é um decodificador. Mas a ideia de uma comunicação circular nos leva à compreensão de que emissor e destinatário se alternam nestas duas posições, ou seja, Kardec foi decodificador quando estudou as mensagens e codificador quando as ordenou. Nesse processo, evidentemente, sua intervenção deixou as marcas da sua individualidade mostradas pelas evidências.
Assim, Kardec terá sido um codificador ativo, participante e, como é consenso entre os espíritas, autorizado pelas fontes. Se na ausência dos documentos originais contendo as mensagens se afirmará que ele, Kardec, é o autor, para os espíritas deverá ser visto como co-autor, ou seja, o material fornecido pelas fontes espirituais recebeu a impressão do pensamento de Kardec.
Mesmo que Kardec tivesse sido uma espécie de coordenador passivo, ainda assim suas marcas estariam presentes no produto final, porque selecionar e ordenar o material implica em tomar decisões e fazer opções, incluir e excluir, dar voz e retirar a voz, o que, em última palavra, significa participar do e definir o produto final.
Kardec, porém, foi muito além disso. Foi também intérprete das vozes espirituais, liderou um processo, produziu questionamentos, direcionou temas, solucionou contradições, superou dilemas, concordou e discordou até chegar a um ponto consensual com as fontes espirituais.
Talvez aqui devamos tocar na transcrição que Araújo faz de um dos diversos trechos em que Kardec fala sobre a sua participação na obra doutrinária, texto que serve a Araújo para reforçar sua convicção sobre a posição autoral de Kardec. Ei-lo.
“Da comparação e da fusão de todas as respostas, coordenadas, classificadas, e muitas vezes retocadas no silêncio da meditação, foi que elaborei a primeira edição de O Livro dos Espíritos, entregue à publicidade em 18 de abril de 1857.”
Araújo questiona o emprego do verbo “retocar” como tradução do francês “remanier”, entendendo que maior precisão haveria se fosse usado o verbo reparar, modificar ou refazer. Apesar das justificativas etimológicas oferecidas por Araújo, parece-me que em nenhum desses casos, ou seja, o emprego de qualquer dos verbos sugeridos ou a manutenção do verbo escolhido pelo tradutor não resolveria a questão da intencionalidade de Kardec.
Não há como dimensionar a ação de Kardec em relação às mensagens por ele comparadas e fundidas, senão especular. Aqui, com certeza, o desaparecimento dos originais se torna mais significativo de ponto de vista do interesse do pesquisador, ao impossibilitar qualquer avanço no desejado estudo comparativo.
O que significa, de fato, comparar, fundir e retocar “no silêncio da meditação”? Qual é a extensão disso em relação às ideias e respostas dadas pelos autores espirituais? A declaração de Kardec tem o objetivo simples de chamar para si a responsabilidade do produto final ou vai além? Qualquer resposta objetiva aqui será mera conjectura.
Estou curioso com a tese que o Augusto Araújo está produzindo e pelo que tenho acompanhado deverá apresentar boa contribuição à compreensão do espiritismo. Da mesma forma, estou convicto de que a questão codificador-autor deveria ser vista com mais naturalidade, na perspectiva de que como codificador é também co-autor e como co-autor é ainda assim o codificador de uma mensagem tão complexa quanto extraordinária.
1 Jornal Opinião, p4, Porto Alegre, julho de 2010.